O presidente Lula da Silva está atordoado após o vexame que foi sua reação amadora ao já famoso vídeo no qual o deputado oposicionista Nikolas Ferreira (PL-MG) levanta suspeitas de que uma instrução normativa da Receita que previa o monitoramento de operações via Pix seria o primeiro passo para cobrar mais impostos. Incapaz de fazer vingar sua versão dos fatos, Lula mandou criminalizar o discurso da oposição, numa clara demonstração de que seu compromisso de defender a democracia – com o qual se elegeu presidente na disputa contra Jair Bolsonaro – nunca foi realmente sério.
Já era previsível a mobilização de partidos e entidades esquerdistas para acionar a Justiça contra os opositores que estão fazendo o governo de gato e sapato nas redes sociais, mas, na prática, o efeito disso é limitado e provavelmente ficará apenas no terreno do ridículo. Por outro lado, a contraofensiva oficial determinada por um presidente da República humilhado mostra que Lula está disposto a usar a força colossal do Estado contra cidadãos que ousam criticá-lo ou levantar dúvidas sobre suas reais intenções, algo que é intrínseco à política. É evidente que isso contraria os fundamentos da democracia e do Estado de Direito.
O deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) e o grupo de advogados Prerrogativas anunciaram representações ao Conselho de Ética da Câmara e à Procuradoria-Geral da República contra o deputado Nikolas Ferreira, acusando-o, entre outras coisas, de “estelionato” e “crime contra a economia popular”. Qualquer um de boa-fé que tenha assistido ao vídeo do parlamentar sabe que ali não houve nada disso. E ainda que houvesse, mentir na política não é crime, assim como é lícito em uma democracia desqualificar medidas governamentais, ao contrário do que alguns querem fazer parecer. Mas aqui ao menos estamos apenas no terreno do pitoresco.
Tudo fica mais sério quando, por ordem direta do Palácio do Planalto, a Advocacia-Geral da União (AGU) aciona a Polícia Federal (PF) para que seja aberto um inquérito policial a fim de investigar a disseminação de “fake news” sobre o Pix, notadamente sobre a suposta taxação do serviço. A tática é manjada: o governo Lula estigmatiza como “fake news” tudo o que lhe desagrada como forma de cerceamento do livre exercício da crítica. Não custa reiterar: espalhar mentiras ou, vá lá, “desinformação” não é crime, salvo em raras exceções tipificadas no Código Penal – apologia ou incitação ao crime, manifestações racistas, crimes contra a honra, contra a saúde pública e fraudes processuais, entre outras. Nada disso se aplica a este caso.